VEJA; de Guzzo, das cabras
recomendo
É preciso ler o que pudermos e dermos conta de, pois;
somente assim saberemos o que pensam que somos quem nos serve, e fartamente, de
informação, e de seus pensamentos a cerca do que vivenciamos diariamente.
Enfim podemos optar, ter escolhas com mais clareza, de que
provavelmente teríamos seguindo tendências impostas por rótulos, dos quais,
sinceramente, talvez não escolhamos por vontade e pensamento próprio.
Fechar os olhos e meramente ser conivente, reclamar sim,
ignorar jamais, do contrario seriamos exatamente o que pretendem que sejamos
tais “desinformadores, de opiniões preconceituosas e maldosamente
tendenciosas”.
Eu vejo atento e desamarro de preconceito.
Minha cabeça? Minha própria sentença.
Quando um veiculo de informação de peso deveria fazer seu
papel mais ESSENCIAL: INFORMAR, ESCLARECER, ILUMINAR A IGNORÂNCIA...
Enfim uma resposta a altura da indecidibilidade dos que se
incomodam e muito com a maneira do alheio viver.
Veja que lixo!
Por Jean Wyllys - Deputado Federal(PSOL-RJ)
Eu havia prometido não responder à coluna do ex-diretor de
redação de Veja, José Roberto Guzzo, para não ampliar a voz dos imbecis. Mas
foram tantos os pedidos, tão sinceros, tão
sentidos, que eu dominei meu asco e decidi responder.
A coluna publicada na edição desta semana do libelo da
editora Abril — e que trata sobre o relacionamento dele com uma cabra e sua
rejeição ao espinafre, e usa esses exemplos de sua vida pessoal como desculpa
para injuriar os homossexuais — é um monumento à ignorância, ao mal gosto e ao
preconceito.
Logo no início, Guzzo usa o termo “homossexualismo” e se
refere à nossa orientação sexual como “estilo de vida gay”. Com relação ao
primeiro, é necessário esclarecer que as orientações sexuais (seja você hétero,
gay ou bi) não são tendências ideológicas ou políticas nem doenças, de modo que
não tem “ismo” nenhum. São orientações da sexualidade, por isso se fala em
“homossexualidade”, “heterossexualidade” e “bissexualidade”. Não é uma opção,
como alguns acreditam por falta de informação: ninguém escolhe ser gay, hétero
ou bi.
O uso do sufixo “ismo”, por Guzzo, é, portanto, proposital:
os homofóbicos o empregam para associar a homossexualidade à ideia de algo que
pode passar de uns a outros – “contagioso” como uma doença – ou para reforçar o
equívoco de que se trata de uma “opção” de vida ou de pensamento da qual se
pode fazer proselitismo.
Não se trata de burrice da parte do colunista portanto, mas
de má fé. Se fosse só burrice, bastaria informar a Guzzo que a orientação
sexual é constitutiva da subjetividade de cada um/a e que esta não muda
(Gosta-se de homem ou de mulher desde sempre e se continua gostando); e que não
há um “estilo de vida gay” da mesma maneira que não há um “estilo de vida
hétero”.
A má fé conjugada de desonestidade intelectual não permitiu
ao colunista sequer ponderar que heterossexuais e homossexuais partilham alguns
estilos de vida que nada têm a ver com suas orientações sexuais! Aliás, esse
deslize lógico só não é mais constrangedor do que sua afirmação de que não se
pode falar em comunidade gay e que o movimento gay não existe porque os
homossexuais são distintos. E o movimento negro? E o movimento de mulheres?
Todos os negros e todas as mulheres são iguais, fabricados em série?
A comunidade LGBT existe em sua dispersão, composta de
indivíduos que são diferentes entre si, que têm diferentes caracteres físicos,
estilos de vida, ideias, convicções religiosas ou políticas, ocupações,
profissões, aspirações na vida, times de futebol e preferências artísticas, mas
que partilham um sentimento de pertencer a um grupo cuja base de identificação
é ser vítima da injúria, da difamação e da negação de direitos! Negar que haja
uma comunidade LGBT é ignorar os fatos ou inscrição das relações afetivas,
culturais, econômicas e políticas dos LGBTs nas topografias das cidades. Mesmo
com nossas diferenças, partilhamos um sentimento de identificação que se materializa
em espaços e representações comuns a todos. E é desse sentimento que nasce, em
muitos (mas não em todos, infelizmente) a vontade de agir politicamente em nome
do coletivo; é dele que nasce o movimento LGBT. O movimento negro — também
oriundo de uma comunidade dispersa que, ao mesmo tempo, partilha um sentimento
de pertença — existe pela mesma razão que o movimento LGBT: porque há
preconceitos a serem derrubados, injustiças e violências específicas contra as
quais lutar e direitos a conquistar.
A luta do movimento LGBT pelo casamento civil igualitário é
semelhante à que os negros tiveram que travar nos EUA para derrubar a
interdição do casamento interracial, proibido até meados do século XX. E essa
proibição era justificada com argumentos muito semelhantes aos que Guzzo usa
contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Afirma o colunista de Veja que nós os homossexuais queremos
“ser tratados como uma categoria diferente de cidadãos, merecedora de mais e
mais direitos”, e pouco depois ele coloca como exemplo a luta pelo casamento
civil igualitário. Ora, quando nós, gays e lésbicas, lutamos pelo direito ao
casamento civil, o que estamos reclamando é, justamente, não sermos mais
tratados como uma categoria diferente de cidadãos, mas igual aos outros cidadãos
e cidadãs, com os mesmos direitos, nem mais nem menos. É tão simples! Guzzo diz
que “o casamento, por lei, é a união entre um homem e uma mulher; não pode ser
outra coisa”. Ora, mas é a lei que queremos mudar! Por lei, a escravidão de
negros foi legal e o voto feminino foi proibido. Mas, felizmente, a sociedade
avança e as leis mudam. O casamento entre pessoas do mesmo sexo já é legal em
muitos países onde antes não era. E vamos conquistar também no Brasil!
Os argumentos de Guzzo contra o casamento igualitário seriam
uma confissão pública de estupidez se não fosse uma peça de má fé e
desonestidade intelectual a serviço do reacionarismo da revista. Ele afirma:
“Um homem também não pode se casar com uma cabra, por exemplo; pode até ter uma
relação estável com ela, mas não pode se casar”. Eu não sei que tipo de relação
estável o senhor Guzzo tem com a sua cabra, mas duvido que alguém possa ter,
com uma cabra, o tipo de relação que é possível ter com um cabra — como
Riobaldo, o cabra macho que se apaixonou por Diadorim, que ele julgava ser um
homem, no romance monumental de Guimarães Rosa. O que ele chama de
“relacionamento” com sua cabra é uma fantasia, pois falta o intersubjetivo, a
reciprocidade que, no amor e no sexo, só é possível com outro ser humano
adulto: duvido que a cabra dele entenda o que ele porventura faz com ela como
um “relacionamento”.
Guzzo também argumenta que “se alguém diz que não gosta de
gays, ou algo parecido, não está praticando crime algum – a lei, afinal, não
obriga nenhum cidadão a gostar de homossexuais, ou de espinafre, ou de seja lá
o que for”. Bom, os gays somos como o espinafre ou como as cabras. Esse é o
nível do debate que a Veja propõe aos seus leitores.
Não, senhor Guzzo, a lei não pode obrigar ninguém a “gostar”
de gays, negros, judeus, nordestinos, travestis, imigrantes ou cristãos. E
ninguém propõe que essa obrigação exista. Pode-se gostar ou não gostar de quem
quiser na sua intimidade (De cabra, inclusive, caro Guzzo, por mais estranho
que seu gosto me pareça!). Mas não se pode injuriar, ofender, agredir, exercer
violência, privar de direitos. É disso que se trata.
O colunista, em sua desonestidade intelectual, também
apela para uma comparação descabida: “Pelos últimos números disponíveis, entre
250 e 300 homossexuais foram assassinados em 2010 no Brasil.
Mas, num país onde se cometem 50000 homicídios por ano,
parece claro que o problema não é a violência contra os gays; é a violência
contra todos”. O que Guzzo não diz, de propósito (porque se trata de enganar os
incautos), é que esses 300 homossexuais foram assassinados por sua orientação
sexual! Essas estatísticas não incluem os gays mortos em assaltos, tiroteios,
sequestros, acidentes de carro ou pela violência do tráfico, das milícias ou da
polícia.
As estatísticas se referem aos LGBTs assassinados
exclusivamente por conta de sua orientação sexual e/ou identidade de gênero!
Negar isso é o mesmo que negar a violência racista que só se abate sobre
pessoas de pele preta, como as humilhações em operações policiais, os
“convites” a se dirigirem a elevadores de serviço e as mortes em “autos de
resistência”.
Qual seria a reação de todos nós se Veja tivesse publicado
uma coluna em que comparasse os negros com cabras e os judeus com espinafre? Eu
não espero pelo dia em que os homens concordem, mas tenho esperança de que
esteja cada vez mais perto o dia em que as pessoas lerão colunas como a de
Guzzo e dirão “veja que lixo!”.
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